temporada 1 • episódio #1
A receita dos fundadores da cerveja Wäls
7.nov.2019
Dois irmãos que saíram de Belo Horizonte para conquistar a Califórnia. Conheça as atitudes que levaram Thiago e José Felipe Carneiro, fundadores da cervejaria Wäls, a fazer um negócio que conquistou a Ambev – e depois começar do zero, de novo, para empreender nos Estados Unidos.
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Tiago e José Felipe Carneiro são conhecidos no universo cervejeiro por transformar a mineira Wäls em uma das marcas mais premiadas do Brasil. Em 2015, a empresa foi comprada pela Ambev e, três anos depois, os irmãos venderam sua participação no negócio para empreender de novo. Começaram a produzir kombucha, bebida gasosa feita a partir da fermentação do chá por uma cultura de bactérias e leveduras, que tem se popularizado no Brasil nos últimos anos. Criaram a KHappy Kombuchas. Os mineiros resolveram expandir o negócio para San Diego, na Califórnia, não só com a nova aposta, mas com a cervejaria Nova Brasil. Realizaram, assim, o que é o sonho de muitos empreendedores: competir no maior mercado do mundo. Nesta entrevista, José Felipe e Tiago falam sobre as diferenças entre empreender no Brasil e nos Estados Unidos, as atitudes que os empreendedores devem ter e por que resolveram começar tudo de novo, do zero.
ATITUDE EMPREENDEDORA. Por que ter uma cervejaria em San Diego?
TIAGO CARNEIRO. Porque San Diego é conhecida como a meca da cervejaria artesanal dos Estados Unidos, onde surgiram várias empresas muito inovadoras no mercado cervejeiro. Além da possibilidade de mostrar nosso hall de bebidas no país, queríamos aprender com eles e, assim, competir de igual para igual.
JOSÉ FELIPE CARNEIRO. No Brasil, temos a KHappy Kombucha, um modelo que também nasceu inspirado no que já se faz na Califórnia e tem crescido muito rápido. Gostamos de replicar nossos aprendizados no nosso país. Continuamos nos Estados Unidos, batendo a cabeça, aprendendo muito e empreendendo de uma forma muito brasileira, com muito orgulho estampado em todos os nossos rótulos e produtos. Deixamos claro que é uma empresa americana, fundada por brasileiros e inspirada no Brasil.
Atitude. O que, hoje, vocês reconhecem como as grandes forças do brasileiro empreendedor?
TC. Nós temos muitas qualidades. Um dos maiores diferenciais que vejo hoje é como o empreendedor brasileiro consegue se adaptar a qualquer situação e dar a volta por cima em relação aos problemas de uma maneira muito mais confortável do que os americanos, por exemplo. A diferença entre nossa empresa e as americanas é que conseguimos reagir de forma ágil, estamos sendo muito reconhecidos por isso. Um dos resultados disso é o desempenho da nossa kombucha alcoólica. Estávamos estudando a bebida há um tempo e, hoje, já somos a terceira marca de kombucha alcoólica na Califórnia e a marca que mais cresce em algumas redes.
Atitude. Quais atitudes vocês acreditam que faz a diferença para um empreendedor?
JFC. Às vezes, as pessoas pensam que empreender é fazer um planejamento de negócio do tamanho do mundo, um powerpoint meticuloso, mas não é só isso. Eu sempre brinco com as pessoas, dizendo que tem que tirar a bunda da cadeira, e nós acabamos criando uma metodologia, que chamamos de VREPD: a primeira parte, o V, seria a visitação, ir ao lugar, saber onde está seu produto e escolher o ponto de venda; R, reposição, o empreendedor precisa fazer a reposição constante, é uma parte bem específica da logística; E, exposição do produto, tem que saber em qual parte da gôndola ele vai estar; P, precificação, não adianta colocar um preço muito alto, porque não vende, nem muito baixo, porque não vai ser lucrativo; depois de tudo feito, vem o D, a degustação desse produto, o empreendedor vai deixar as pessoas degustarem, conhecerem, experimentarem. Isso faz parte de uma coisa que aprendemos ao longo dos anos, cuidando das indústrias e colocando o produto na frente do consumidor final. O empreendedor tem que bater à porta do supermercado com seu produto e até conseguir o retorno de alguém.
TC. Eu ainda sigo aquele modelo tradicional, que acredita que o empreendedor tem que visitar o mercado, não tem muito atalho, e eu acho este um grande diferencial do nosso time. Nossa empresa é formada por pessoas de vários países diferentes, e essa força de vontade, esse trabalho de realmente ir a campo e ver seu produto no mercado, de conhecer realmente seu cliente, é universal. É um modelo de empreendedorismo que pode ser aplicado em qualquer lugar do mundo.
Atitude. De maneira genérica, dá para falarmos em diferença cultural de postura entre o trabalhador brasileiro e o americano?
TC. Quando vim para os Estados Unidos, tinha uma visão crítica do Brasil, mas sinto falta da mão de obra brasileira. O brasileiro é disciplinado e muito trabalhador. Nós temos muita vontade de realizar as coisas e somos muito organizados. Por outro lado, estamos aprendendo com a atitude dos americanos de se programarem muito bem. Porque se o dono do mercado decide mudar o setup de um setor uma vez por ano, ele pensa e se programa muito antes de fazer algo. Tem os prós e os contras, mas, de forma geral, cada dia eu fico mais encantado com o potencial que nós, brasileiros, temos e como nós somos competitivos globalmente no quesito empreendedorismo.
Atitude. E a burocracia, da qual tanto se reclama no Brasil. É mais simples nos Estados Unidos?
JFC. Uma vez, precisávamos mandar uma carga para a outra costa, eram 7 horas da noite, e eu não conseguia um frete. No Brasil, bastaria um telefonema para resolvermos o problema, o processo é mais rápido. Nos Estados Unidos, por mais que a logística seja fantástica, tudo tem que ser muito bem programado, se fugir um pouco do plano, não será realizado. Eles não quebram regras e a burocracia é muito demorada. Para conseguir uma licença para produzir álcool demora muito tempo. Como é tudo muito bem organizado e estruturado, eles querem controlar muita coisa também. Mas isso depende de cada estado dentro dos Estados Unidos, hoje estamos na Califórnia, que é um estado extremamente desenvolvido e o mais rico, então, tudo é superdimensionado.
Atitude. Por que vocês saíram da sociedade com a Ambev? Por que venderam a Wäls e começaram tudo de novo?
JFC. Aprendemos muito com a Ambev, por isso, achamos que era a hora de aplicar tudo o que tínhamos aprendido com nossas próprias asas. Olhando do lado de fora, hoje, tenho certeza de que a Ambev tem muito orgulho do que temos feito aqui no mercado, porque, se antes já éramos um foguete, colocamos um combustível melhor depois que entramos para a empresa; e agora nós vamos voar mais alto ainda.
TC. Uma grande empresa tem muitas regras para serem seguidas. Vimos que dá para produzir muito do nosso jeito, quando estamos 100% liberados. Um exemplo bem simples: há dois dias, cheguei com o teste de um líquido que estudamos há muito tempo e que tem propriedades da cannabis. Meu irmão topou fazer uma bebida na hora. Se fosse em uma empresa maior, teria um processo de compliance, de estudos técnicos para entender, explicar e pedir autorização. Quando temos a liberdade de tocar nossa empresa, podemos fazer e assumir alguns riscos calculados, que vão nos trazer a ponteira da inovação. Hoje, a nossa missão é construir a empresa de bebidas mais inovadora do mundo. Vamos batalhar muito para construir esse sonho. Nós viemos para os Estados Unidos, temos certeza de que foi a decisão certa, a Califórnia é muito reconhecida por inovação. Continuamos investindo no Brasil também e somos a maior fábrica de kombucha da América Latina, algo extremamente inovador. Ainda estamos no começo.
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