temporada 1 • episódio #12
O autodidata do blockchain
21.jan.2020
Marcelo Sampaio é uma das raras pessoas que consegue explicar a tecnologia cripto de maneira inteligível. Ele chegou a flertar com o teatro na adolescência, sonhou em virar astronauta e depois de uma passagem por empresas de tecnologia virou empreendedor.
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Marcelo Sampaio é cofundador e CEO da Hashdex, fintech pioneira em investimentos regulados no mundo do blockchain. A Hashdex é definida como um encontro entre Wall Street e o Vale do Silício. Marcelo tem mais de 30 investimentos em venture capital em diversos países e 20 anos de experiência em empreendedorismo e tecnologia. É investidor experiente em criptoassets e faz diversas palestras sobre o assunto. Também investiu em muitas empresas quando estavam começando e que depois deslancharam, como Quinto Andar, Volante, Dog Hero e Nibo.
ATITUDE EMPREENDEDORA. O que é essa junção entre Wall Street e Vale do Silício? Como é o mercado em que vocês atuam?
MARCELO SAMPAIO. A Hashdex é uma gestora regulada em vários países. Estamos no Brasil, nos Estados Unidos e em Cayman. Basicamente, nosso objetivo é dar ao investidor acesso ao mundo de cripto, que tem muita loucura. Queríamos algo completamente regulado, seguro e simples, com produtos que o mercado financeiro está acostumado a comprar. Porque apesar de haver muito barulho nesse negócio, há uma chance enorme de o cripto ser o futuro.
Atitude. E por que cripto? Esse mercado vai mudar o dinheiro?
MS. Eu falo que a parte do dinheiro é a ponta do iceberg. Eu comparo muito o mundo blockchain com o mundo cripto e com a internet, que foi a última grande evolução que a gente viu. A internet começou com a ideia de troca de mensagens, que começou com o exercício americano de tentar melhorar o Código Morse. Em algum momento, você pôde mandar textos de um lado para o outro por meio das redes, até o grande primeiro caso de uso: o e-mail. A gente começou a usar o e-mail e, por um longo período, a internet foi isso. Até que, um dia, inventaram o browser, e o mundo mudou. Depois, inventaram o mobile, e o mundo mudou de novo. Inventaram o Cloud e, mais uma vez, o mundo mudou. Hoje, há uma série de invenções subsequentes que nos trouxeram a possibilidade de só precisar apertar um botão em um aparelho – que não existia há pouco tempo – para logo depois aparecer um carro preto na frente de casa. Quando falamos de ideias de dinheiro para a cripto é um pouco como a ideia do e-mail dentro da internet. Cripto é um negócio muito maior do que só a ideia do dinheiro. Para explicar melhor o que é cripto, basta pensar na internet. Ela transformou, foi disruptiva com a informação, mudou completamente seu significado; e o cripto faz a mesma coisa com a ideia de valor. Eu acho que, no fundo, o papel do cripto é criar maneiras para valorizarmos as coisas antes desvalorizadas, criar liquidez para situações que não eram líquidas e criar conceitos até então inexistentes.
Atitude. Como você teve a ideia da Hashdex?
MS. Em 2011 e 2012, eu passei muito tempo na Califórnia, no Vale do Silício, trabalhando na Oracle, que era uma empresa que estava me levando muito para São Francisco. Em uma de minhas buscas pela internet, eu encontrei um fórum que discutia o bitcoin de forma muito apaixonada. Fiquei curioso e peguei o paper do Satoshi Nakamoto, em teoria, o homem que inventou o bitcoin – mas ninguém sabe se foi um grupo de pessoas ou um indivíduo só. Eu li o paper e pensei: “Acho que esse cara descobriu alguma coisa”. Ele propunha algo que, até então, a gente não tinha visto. Na época, as pessoas só discutiam o assunto. Como viajava bastante, tinha várias conversas sobre o tema. Eu posso ser considerado um insider, porque peguei essa história desde o começo e tive muito interesse em investir e me aprofundar. Eu tive uma visão muito clara, ainda cedo, de que esse negócio era mais do que dinheiro. O bitcoin, até hoje, é a maior rede. Mas eu falava assim: “Essa ideia de rede incentivada é o open source 2.0. Isso vai transformar não só o mercado, mas a humanidade. Então, eu fundei a Hashdex. Foi um daqueles processos mágicos que acontecem na vida e realmente tomam conta.
Atitude. Conte-nos de onde você veio.
MS. Na minha adolescência era moda fazer teatro, então, meus amigos e eu fizemos um curso de teatro. Eu era muito intenso em tudo o que fazia. Comecei a estudar teatro e fui bem. Até que o diretor, Roberto Bomtempo, me chamou e disse: “Marcelo, eu sei que teatro é uma brincadeira para você, mas eu estou montando uma peça e quero convidá-lo. Mas, se você aceitar, será realmente um trabalho”. Foi uma época muito interessante da minha vida. Fizemos a peça “Capitães de Areia”, foi a mais assistida de 1993, e acabei virando ator profissional naquele momento. Também fiz um pouco de cinema e televisão. Foram dois anos muito intensos, mas eu estudava em uma escola puxada e precisei escolher. Eu gostava muito da escola e dos meus amigos, então, entendi que o certo, para mim, naquele momento, era voltar a estudar. Eu sempre fui muito orientado pelos meus sonhos e decidi ser engenheiro espacial. No fundo, acho que eu queria ser astronauta, mas dizia que queria ser engenheiro espacial, porque parecia mais importante. Determinei isso como objetivo para os anos seguintes. Fui para a PUC, fiz engenharia e, quando estava no quarto período, decidi que faria estágio quando chegasse ao sexto período. Criei uma estratégia que consistia em participar de todos os processos seletivos que eu pudesse para aprender. Assim, quando eu quisesse trabalhar, eu estaria craque. Algumas semanas depois, uma executiva, chamada Roberta, da Microsoft me ligou e disse que haviam selecionado meu currículo, entre três mil, para uma dinâmica de grupo para uma vaga no programa de trainee. Da dinâmica, quatro candidatos passariam para a entrevista final. Eu não queria trabalhar, porque sentia que não era a hora – ainda estava apenas treinando para aprender sobre os processos seletivos. A dinâmica seria na terça-feira, às 11h. Eu tinha um treino futebol na mesma hora e não queria perder, por isso, disse à Roberta que, infelizmente, eu tinha um compromisso inadiável. Então, ela ofereceu um horário na quinta-feira e eu topei. Quando cheguei lá eu tive a noção do que realmente era.
Atitude. O que você viu lá que o despertou?
MS. Foi a energia, era diferente. Era o mundo tech com a ideia de “vamos inventar o futuro e vamos fazer isso felizes, mas não vai ser fácil”. Quando eu vi aquilo, falei: “É isso que eu quero”. Era uma dinâmica de grupo, e eu arrebentei. No final, marcaram a entrevista comigo e com outros três finalistas e pensei: “Já tirei 28, então, preciso ser um dos quatro”. Fiz a entrevista duas semanas depois, com o executivo que seria o responsável pelo escritório do Rio. Foi uma conversa muito legal, mas só conversamos sobre coisas da vida. Se ele me contratasse, seria por ter me achado legal, porque eu não tinha dado nenhum elemento para ele acreditar que eu era o ideal para a vaga. Fiquei com isso na cabeça. Falaram que a resposta seria dada em, no máximo, dez dias. Duas semanas se passaram, e ninguém me ligou, achei que não tinha passado. Decidi ligar para a Roberta, e ela me deu o seguinte feedback: “Marcelo, dos quatro, eles ficaram em dúvida entre dois, e você não é nenhum dos dois”. Eu estava decepcionado, mesmo não querendo trabalhar desde o início. Mas, por outro lado, não dei os elementos para me contratarem. Decidi explicar isso para o executivo que me entrevistou. Eu me lembro de pegar o telefone e discar 102. Pedi o telefone da Microsoft do Rio. Obviamente, a Microsoft não tinha secretária, quem atendeu foi uma máquina. Comecei a testar e caí no ramal de um homem chamado Gustavo Fux, que me atendeu. Pedi para falar com o Antônio Morais, a pessoa que havia me entrevistado, e o Gustavo me passou o ramal dele. Dei aquela respirada funda e liguei para o Antônio. Quando ele atendeu, me apresentei e disse: “Antônio, deixa eu participar da segunda rodada de entrevistas e vou explicar para vocês por que eu sou sua melhor opção”. Ele falou: “Com certeza, fechado”. E, para essa entrevista, eu fui para ganhar. Bullshit zero.
Atitude. O que você acredita que te ajudou na sua trajetória?
MS. Temos um monte de ideias, mas, na maioria das vezes, não ousamos, porque vai dar errado. Porém, a questão não é sobre se permitir, mas sobre acreditar que vai dar certo. Eu digo que, independentemente de não dar certo, fazer é o que gera mais valor. Isso para mim é fundamental. Nós nos podamos muito ou permitimos que outras pessoas nos podem, sendo que precisamos ir lá e fazer.
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