temporada 1 • episódio #6
Um caminho inusitado
3.dez.2019
O monge Satyanatha começou uma carreira executiva mas logo entendeu que sua realização não estava em trilhar o caminho mais óbvio. Passou 7 anos em um monastério no Havaí e hoje se dedica a difundir a meditação e o autoconhecimento no Brasil.
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O monge Satyanatha nasceu como Davi Murbach no interior de São Paulo, estudou Engenharia da Computação e foi trabalhar em consultoria estratégica. Mas algumas questões existenciais, que às vezes acontecem a todos nós, foram muito intensas para ele. Nessa inquietude ele começou a ler sobre espiritualidade e acabou indo para um dos mais respeitados monastérios do mundo, onde viveu por sete anos. Já faz alguns anos que voltou à vida em sociedade, morando na capital paulista, onde faz atendimentos particulares, coletivos e ensina meditação. Recentemente, lançou o livro Seja Monge, pela Companhia das Letras. Nesta entrevista, ele fala sobre si, seus propósitos e sobre como enxerga a humanidade e seus potenciais.
ATITUDE EMPREENDEDORA. Saty, vamos começar do começo: quem é você?
SATYANATHA. “Quem é você?”. Essa é a pergunta mais importante e mais difícil de todas. Porque ela tem várias camadas de significado. E, na verdade, comecei nessa jornada porque não sabia quem eu era. Tentei ser um executivo, e aquilo me doeu, me machucou, senti um grande vazio e disse: “Eu não sou isso. Sou alguma coisa, mas isso não”. Então, fui buscar o que eu era. Mas nunca somos uma profissão nem um ofício. É muito comum perguntar para alguém: “Você é o quê?”, e a pessoa diz, por exemplo: “Arquiteto”. Me dá vontade de arrancar os cabelos que não tenho, porque eu tenho a cabeça raspada [risos]. Tenho vontade de falar: “Não, você exerce o ofício de arquitetura, quem sabe se, além de uma profissão, também seja um ofício, se você tiver amor suficiente por ele, mas você é muito mais”. Eu ainda estou para ver uma pessoa que responda: “Eu sou alguém que busca o conhecimento de mim antes de conhecer os outros. Gosto de pôr do sol, de sentir o vento gelado e depois entrar no cobertor, e eu tento encontrar uma maneira de expressar melhor a cada dia aquilo que eu tenho como claro dentro de mim, o respeito pelos outros”. Nunca encontrei alguém que me desse uma resposta poética dessa. Eu sou só mais um de nós. Sou monge, mas, primeiro, humano. Eu também vou cair nas mesmas bobagens de falar quem eu sou. Vou dizer que eu sou um monge, eu vou dizer que, tendo nascido no Brasil, eu tive uma infância e um crescimento que talvez vá ressoar como os de muita gente. Eu assistia a Balão Mágico, aos desenhos animados na TV, ao The Jetsons. Eu cresci como um adolescente comum. Eu ouvia rock, gostava de Ozzy Osbourne e de Led Zeppelin.
Atitude. Teve o coração quebrado por algumas pessoas?
S. Sim, lindamente. Tive algumas companheiras muito interessantes e alguns corações quebrados, o que é interessante, porque depois que você cola de novo, parece que ele bate maior. Talvez não melhor, mas maior. Cresci no Brasil, fui um adolescente comum, talvez um pouco mais inquieto. Quando entrei na vida profissional, senti um vazio enorme. E aí eu falei: “Bom, preciso trocar de namorada”. Troquei. “Preciso comprar um novo carro”. Comprei. “Preciso mudar de emprego”. Mudei. E nada me preenchia. Aí eu comecei a descobrir que eu era alguém que precisava de significado. Há pessoas que conseguem viver com coligações, eu me ligo a você, fazemos esse projeto juntos. Algumas pessoas se saciam com isso, não tem nada de errado. Outras pessoas se satisfazem com glórias, eu fiz isso, eu fiz aquilo, de um jeito tanto egoico quanto de propósito – os dois são verdadeiros. Esse é o tipo que gosta de concretizar. Descobri que eu não era nem o que concretizava, nem o das ligações e afeições. Descobri que significado me tocava muito. Monge é quem se dedica ao significado, a tudo ser tão coligado e ter tanto significado que você se sente unido àquela coisa. Se você olha um pôr do sol e fala: “Ai, que bonito, pôr do sol, vamos jantar?”, isso não é uma experiência de monge. Se você olha o pôr do sol e naquele instante sua mente fica vazia, e existe o sol e você, e você tem uma experiência de monos, eu e o sol nesse instante, somos um, só existe esse instante. É o monos; e é isso que faz o monge. O monge é alguém que consegue olhar nos olhos de uma amiga e sentir o grande significado desse instante, por mais prosaico que ele seja. E quando eu descobri que era viciado em significado…
Atitude. Viciado no agora?
S. Viciado no agora, em tudo ser importante como é. Mas quem é o Saty hoje? Eu sou alguém que, tendo encontrado uma experiência de significado profunda, acredita que todo mundo pode se beneficiar um pouco disso, independentemente de onde estiverem. O ser humano acelerado não é ele mesmo. A nossa melhor versão é uma versão equilibrada, que pode acelerar, mas pode frear, é o centro de nós. E aí eu fui para o monastério. Gente, eu não sou filho de Buda com Madre Teresa. Minha mãe é baterista numa banda de rock.
Atitude. É mesmo?
S. É verdade. Chama-se Keep Rocking. Toca Queen e Rolling Stones. Fui para o monastério porque eu era desequilibrado. Aquelas ferramentas me serviram, eu era o caso mais grave. Posso trazer essas ferramentas hoje para quem quiser e elas vão funcionar ainda melhor do que funcionaram comigo, porque eu estava desesperado e, hoje, eu sou mais feliz. Sou alguém que, na busca pelo significado, encontrou ferramentas muitas válidas e que tenta aplicá-las onde estiver, até no meio de São Paulo.
Atitude. Se você consegue fazer no meio de São Paulo, consegue fazer em qualquer lugar, não? Porque, olhando o pôr do sol numa praia deserta, é mais fácil se conectar e limpar a mente. Agora, enquanto tem dez clientes esperando um retorno, a pessoa do carro da frente buzinando no trânsito e a roupa para lavar em casa é muito mais difícil.
S. Concordo, mas aí eu pergunto: quando você mais precisa da habilidade de se conectar com algo mais verdadeiro em você? Quando tudo está bem ou exatamente quando tem os clientes desesperados? Vivemos esse paradoxo de que estamos bem quando tudo está fácil, e está mal quando está difícil. E se fizéssemos o contrário? Ou pelo menos, se estivermos bem o tempo todo, procurarmos esse bem? Estar bem não significa colocar óculos cor-de-rosa e falar: “Gente, está tudo lindo. Nossa, está tudo maravilhoso. Olha essa goteira no teto, que ótimo”. Uma coisa que aprendi e mudou muito a minha vida, e a minha visão do que é ser monge, é que o monge não é uma pessoa conformada, que você pisa no pé dele e ele fica quieto, e aí ele fala assim: “Você tem 30 minutos para sair do meu pé”. A grande aceitação do monge é o momento presente. Eu aceito que agora estou aqui com vocês, acho uma delícia estar aqui com vocês, mas se tivesse alguma coisa nos incomodando, eu teria que aceitar o momento presente. Aceitar o presente, me acalma, eu não vou ficar irritado, eu aceito que tudo é como é. Só que isso não faz com que eu seja alguém acomodado e não conserte o que precisa ser consertado. É algo muito dinâmico e ativo, em que você, na verdade, aloca as suas energias de transformação para onde elas serão úteis. Quanta gente não trava guerras internas mentais em vez de canalizar isso para uma construção de algo positivo fora. Você tem discussões dentro de você e ganha as discussões dentro do chuveiro, com pessoas com as quais nunca vai discutir. Ou você tem planos e não canaliza essa energia. O monge é alguém que faz um budget e uma alocação um pouco mais calma e ponderada da própria energia. Adianta eu me irritar com algo externo? Não, zero. Mas adianta eu consertar o que puder? Sim, adianta. Eventualmente, aprendemos o maquinário humano, estudando a própria mente. Sou absolutamente igual a todo mundo, fico bravo, tenho medo. Mas quando a raiva chega eu falo: “Opa, chegou uma raiva. Atenção, chegou uma raiva, como devo processá-la?”. Querem ver como funciona a cabeça de monge? Toda raiva é um pedido de ação. Não existe raiva que você tenha sentido que não tenha sido um pedido para você agir: “Vai lá e esgana aquela pessoa. Vai lá e diga tais verdades. Vai lá e bate o pé para corrigir essa injustiça”. Mas, além do pedido para agir, ela traz uma sugestão de método. E esse método, em geral, é péssimo, mas o pedido de ação é verdadeiro. Quando você aprende a lidar com sua mente, e é o que o monge faz, vem uma raiva, você para: “Opa, já vi isso antes, é um pedido de ação. Qual é a ação proposta? Ah, tem que resolver tal problema. Eu não vou usar esse método porque ele é muito briguento”. Quando deixa de apenas reagir ao que acontece, você se torna piloto da própria mente. Aí fica mais fácil olhar aquele pôr do sol em São Paulo, fica mais fácil olhar o mar de luzes vermelhas dos freios do engarrafamento e pensar: “Que cor bonita”.
Atitude. Parece que existe uma confusão entre autorresponsabilidade e urgência de sair resolvendo tudo agora. Ao mesmo tempo, existe uma confusão de que a aceitação, a capacidade de viver o momento presente, seja uma passividade. Você vê essas confusões?
S. A autorresponsabilidade é muito legal, você como escultor de si mesmo, o seu maior projeto é você. Contudo, se essa autorresponsabilidade não trouxer junto uma noção de caminho – tem um passo, depois outro passo, depois outro passo – é gerada uma ansiedade absurda. Porque nos olhamos e percebemos que somos um projeto absolutamente inacabado, imagino que todo ser humano seja. Se você não falar assim: “Olha, não interessa que está inacabado, tem o cronograma, você vai dar esses passos e depois aqueles outros passos, você vai se trabalhar”. Se você não tiver esse amor pela caminhada, essa noção de antes, durante e depois, facilmente, ao tentar melhorar, você ficará ansioso. Pois começará a se comparar, e isso gasta energia. A gente não percebe o quanto tudo é energia. Se eu jogo a minha energia na ansiedade, a minha ansiedade cresce. O que não vai crescer? Minha convicção, minha deliberada nova caminhada, minhas transformações, meu trabalho de autoconhecimento, minha coragem, meu estudo. Tudo isso tem um combustível só: nossa energia e nosso tempo. É preciso saber alocá-los.
Atitude. Será que precisamos explicar para quem está nos lendo por que estamos entrevistando um monge sobre atitude empreendedora?
S. Eu sei que vocês [do Atelier de Conteúdo] frequentemente falam que é preciso começar de dentro. Você tem que empreender dentro de você e trabalhar quem você é, trabalhar seus conceitos. Um dos grandes segredos que, talvez, um monge possa trazer é que o equilíbrio é dinâmico, esse equilíbrio que buscamos não é sentado na montanha para todo o sempre. O equilíbrio é altamente dinâmico, ele é feito de constantes autocorreções. Se eu vou me corrigir sempre, preciso ter muito boa vontade comigo, porque se eu erro, tudo bem, vou corrigir; se eu acerto, nossa, vou corrigir para fazer ainda melhor; me comuniquei mal, vou corrigir.
Atitude. Mas podemos celebrar também quando acertamos?
S. Muito! Não só celebrar. Isso é interessante. Que tal pensarmos rapidamente no que erramos e longamente no que está dando certo? Porque tudo o que pensamos é energia. Então, se fizermos isso, vai ser assim: “Ai, que bom, né, gente? Que gostoso, né? Nossa, então, deu certo”. Você deixa aquilo reverberar como uma música boa que toca dentro de você. Vamos para a frente, estamos conseguindo, porque todo pensamento tem uma energia, traz o “autopositivo”, que reforça sua coragem, seu empreendedorismo, faz você lembrar por que entrou nessa. Sobre o que precisa ser corrigido, meu mestre dizia: “Como o beija-flor, ele entra na flor, pega o néctar e sai”. Aquilo que é negativo, ou que precisa de correção, vamos direto, com firmeza e coragem. Isso tem que mudar, vou mudar. Pronto, decidido, fiz. E tem que ser breve, senão ficamos para baixo. Não é para ficar sentado se perdoando: levante e se perdoe ao se melhorar a cada dia.
Atitude [Ariane]. Eu queria que você contasse uma história muito engraçada que me contou uma vez quando meu computador deu problema. Fui trabalhar na sua casa e estava lá com meu MacBook. Ficava vindo aquela mensagem para atualizar, e eu não queria parar o que estava fazendo, numa aitude totalmente antimonge. Então, você falou: “Calma, eu acho que posso ajudá-la”. Eu falei: “Bom, ok, um monge deve poder ajudar em qualquer área”. Mas sua ajuda não era exatamente divina [risos]…
S. “Seu computador está com problema, vou pegar um incenso e fazer um mantra para arrumar o computador”[risos]. Eu vou contar essa história, até porque ela mostra coisas superlegais sobre o ser humano, sobre os mantras indianos antigos – aliás, todos eles rimam. E rimam, são muito musicais, por um motivo simples: antigamente não existia a escrita, as palavras vieram antes do sistema de escrita, há 3 mil anos. Quando inventaram essa tal de escrita e o papel, os monges ficaram desconfiados. Séculos depois da invenção da escrita nenhum texto sagrado tinha sido escrito. Vamos avançar esse filme até 1986, ano do primeiro Macintosh. E aí o mestre do meu monastério falou: “A gente não vai passar de novo o vexame de desconfiar da tecnologia. Tecnologia é como uma faca, ela pode machucar, mas pode ajudar no jantar. Vamos utilizar para o bem, vai lá e compre um Mac”. Eu não estava lá, era criança ainda, mas saiu um monge chamado Brahmanathaswami e comprou um Mac. Nada contra PCs, inclusive o Windows está muito bom hoje, mas foi a opção dos monges naquela época. A própria Apple, depois, foi fazer um documentário para mostrar a seus funcionários os monges malucos que tinham a tradição de usar computadores e usavam roupas que não tinham nenhum fio de costura. A roupa que a gente usa dentro do monastério não é essa que eu uso agora, é um pano comprido, que você amarra ao redor do corpo e não tem um fio de costura. Bom, eu estudei engenharia da computação, aquilo era relativamente fácil para mim. Mas a grande verdade é: quando você tem a mente relativamente clara para o treinamento não tem medo de não saber. Por isso, quando eu vi o que estava acontecendo no seu computador, falei: “Posso ajudar a resolver?”. Ela me olhou com uma cara de: “Você? Vai fazer um mantra, né?”, e eu: “Não, não. Deixe-me ver”. E aí ela gentilmente me deixou trabalhar ali. Tinha um problema no iCloud que precisava ser resolvido pelo UNIX, era avançado, mas eu não sabia quando eu comecei a tentar resolver. Então, eu pesquisei no Google, ali na minha salinha sagrada, no computador da Ariane, como poderia resolver aquilo. E eu soube seguir os passos, porque eu tenho familiaridade com computação. Coloquei os comandos de UNIX no terminal, porque eu sabia o que isso significava, e funcionou, a gente nunca mais teve esse problema.
Atitude. Eu não tinha ideia de que tudo isso tinha acontecido. Para mim, você tinha chegado lá, operado um milagre e resolvido.
S. Eu vou explicar um pouco melhor. Quando estava no início do monastério, se alguém chegasse para mim e falasse: “Satyanatha, você fez aquele ritual errado”, o que eu ia ouvir? “Satyanatha, você errou. Você tem pouco valor, você é um fracasso”. Eu teria ouvido isso, porque é muito normal o ser humano, principalmente num momento em que está tentando tanto acertar, misturar o ato e o ator. Por isso, quando as pessoas criticavam o meu ato eu me sentia criticado. Depois de alguns anos, meditando, respirando, acordando de madrugada… Os monges meditam, todos os dias, das 4h30 às 8h da manhã. Os novatos precisam meditar no fim do dia também – eu era um desses. Meditei mais ou menos 20 mil horas nessa vida já. Depois de alguns anos de meditação, consegui começar a separar o que eu faço de quem sou. E, depois, se alguém falasse: “Saty, aquilo ali você fez errado”, eu respondia: “Ah, é? Como é faz certo?”, “Assim”, “Nossa, muito obrigado”. Em vez de me dar tristeza, começou a me dar alegria. Cada vez que alguém falava: “Saty, você fez errado”, era o início de um capítulo na minha vida em que eu nunca mais cometeria aquele engano.
Atitude. Você está falando de uma coisa muito pregada no mundo dos negócios hoje: a tolerância ao erro para aprender mais e mais rápido. E, na verdade, é uma coisa essencial da existência.
S. Se você tem dificuldade para lembrar isso, pare em algum momento e tente usar aquilo que chamamos mindfulness, ou seja, atenção plena. Pare num instante e tente caminhar, caminhe, no escritório ou onde você estiver. Caminhe prestando atenção à respiração, caminhe sentindo o corpo, cada passo que você der. Você vai perceber com atenção plena que, quando caminha, é só através do desequilíbrio que consegue ir para a frente. Você põe todo o peso na perna direita, aí coloca todo o peso na perna esquerda, aí na direita de novo, na esquerda de novo. Você vai errando, digamos, criando desequilíbrios, mais para lá, mais para cá, mas o conjunto o propulsiona para a frente. Se você tentar logo de cara atingir algo mágico, que o leve exatamente aonde quer chegar, não vai conseguir, porque isso, em geral, não existe. Existem sucessivos pequenos desequilíbrios que você, por estar muito ligado ao seu propósito, à sua verdade, à sua vontade de aprender, corrige suficientemente rápido para que o movimento total seja para a frente e para o alto.
Atitude. Para um monge, a humanidade, enquanto grupo, está andando para a frente, para trás, ou está estagnada?
S. Eu não sei, mas posso dar um palpite. Vou dizer, dentro da minha ignorância, o que eu sinto quando olho para esse mundo. E a resposta, para mim, é assim: antes era mais fácil mentir para nós mesmos, era mais fácil as pessoas ficarem oprimidas, num casamento infeliz, num emprego nada a ver, numa burocracia muito estagnada, e tudo se escondia em meias verdades e na própria lentidão do processo. Hoje em dia, estamos numa hiperevidência de tudo, a propagação de qualquer informação é rapidíssima, inclusive sobre nós mesmos. De repente percebemos algo sobre nós que, se fôssemos nossos avós, iríamos enterrar bem enterradinho. Mas hoje ponderamos, procuramos ler sobre isso, conversamos com um amigo, falamos com um terapeuta. Há uma efervescência absoluta, não é uma piora. É como se toda a poeira tivesse levantado, mas ainda não desceu, e está todo mundo tossindo. O que eu vejo é: muitas das revoluções que vão melhorar o mundo não são ideológicas, a ideologia é necessária, mas muitas revoluções serão tecnológicas. Quando conseguirmos resolver certos problemas, eles deixarão de existir. Por exemplo, quando a energia solar, a eólica e outras energias se tornarem muito mais baratas do que o carvão e o petróleo, algo que, no início, parecia ideológico será resolvido. A humanidade tem que exercer a tecnologia, tem que exercer a inteligência para que a gente consiga melhorar. O que para mim está acontecendo, e é muito nítido, é: aumentaram os decibéis de tudo, das minhas angústias internas, das do meu vizinho, das do meu primo, das incompetências das pessoas em posições de comando. Eu observo um absoluto ruir de todas as posições hierárquicas. Então, ou você é bom ou o fato de você ser chefe não vale nada, o fato de você ser presidente da República não lhe traz automático respeito, você precisa ser alguém que mereça esse respeito. Hoje em dia, para uma empresa ser bem-sucedida e conseguir explodir, demanda muito menos tempo do que antes. Antigamente era preciso esperar anos para ver se a lojinha ia conseguir andar. Hoje, conseguimos fazer coisas de alcance extraordinário. A luz parece que está mais brilhante. Por outro lado, aquilo que é escuro, as ideias mais retrógradas, o autoritarismo, o separatismo, o “eu sou diferente de você e, portanto, melhor que você”, parecem estar piorando também. Mas eu não acho que esteja realmente piorando, eu só acho que existe uma separação. Quem almeja ir para a frente, criar um mundo melhor, nunca esteve tão bem e unido. Quem deseja levar todo mundo para o passado também está muito fortalecido. Meu mestre dizia assim: “No momento da alvorada, no amanhecer, você é quem decide se é dia ou se é noite”. E é o momento em que estamos, e eu decido que é dia. Na minha vida é dia. O sol ainda está chegando, mas para mim já é dia.
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