O que a carta de Jeff Bezos revela sobre a cultura corporativa da Amazon

Terça-feira, dia 28 de julho de 2020. Jeff Bezos, fundador da Amazon, publicou uma declaração no “The Amazon Blog” um dia antes de prestar seu depoimento perante o Subcomitê Antitruste da Câmara de Representantes dos Estados Unidos, a respeito de práticas competitivas e formação de monopólio em mercados em que atua. No longo texto (como é seu costume), Bezos antecipou informações pertinentes à audiência que duraria cinco horas e na qual seriam interrogados, além dele, Mark Zuckerberg (Facebook), Sundar Pichai (Google) e Tim Cook (Apple).

Deixando de lado a questão do depoimento do empresário bilionário ao comitê parlamentar, esta carta traz a essência da cultura corporativa da Amazon. Nela, Bezos deixa claro os princípios e os valores que forjaram a história da gigante do e-commerce. Isso nos mostra o quanto a cultura corporativa é fundamental para o sucesso de um negócio. É ela que indica o “jeito de fazer de uma empresa”, o caminho pelo qual as pessoas devem seguir para levar a organização em direção à própria vocação.

Muito além de dados e informações práticas, na carta, ele conta um pouco sobre sua história de vida e desafios ao longo da trajetória de empreendedor. Por isso, no Atitude Empreendedora, destacamos alguns trechos que exemplificam a força da cultura corporativa da empresa. 

1. Luta e transparência.

Bezos começa sua narrativa aparentemente desviando do tema em questão. Não fala de monopólio tampouco do meio empresarial. Em vez disso, conta que sua mãe, que engravidou aos 17 anos, teve que batalhar para que a escola aceitasse que ela terminasse os estudos. Mais tarde, ela se casou com um imigrante, a quem ele chama de pai.

Os desafios e a maneira como os líderes de sua família superaram as adversidades foram essenciais para a formação de Bezos. A essência de enfrentar as dificuldades com capacidade de negociação, mas sem abrir mão do que realmente importa, estaria presente em tudo o que ele realizaria a seguir.

Além disso, o tom que ele adota para seu discurso é de transparência, trazendo emoção sem perder a estrutura, o que tende a gerar empatia com quem está do outro lado da tela e explica, em alguma medida, porque o fundador da “loja de tudo” se tornou uma referência para outros grandes líderes empresariais.

2. O sonho e a persistência.

Ao falar da idealização do conceito da Amazon, em meados dos anos 1990, Bezos conta que trabalhava em uma empresa de investimento, que oferecia a estabilidade desejada por muitos, mas decidiu se arriscar e criar a própria startup. Queria apostar na internet muito antes de este mercado se provar promissor. A viabilidade de seu plano foi questionada por pessoas influentes em seu meio, mas ele sabia o que vislumbrava e teve determinação para perseguir seu sonho.

3. Todo dia é o primeiro.

O Day One se tornou um dos pilares da cultura da Amazon. Consiste em manter a mentalidade de uma empresa em seu primeiro dia de existência independentemente do tamanho que ela tenha alcançado. Não significa ignorar a grandeza e a responsabilidade de uma companhia global. Mas, sim, usar essa mentalidade jovem para ter o melhor dos dois universos: o escopo e a capacidade de uma gigante e o espírito, a energia e o coração de uma startup.

4. O real foco no cliente.

Embora o “foco no cliente” faça parte do discurso das empresas muito antes de a Amazon nascer, Jeff Bezos parece ter revigorado seu significado. Na última década, grandes companhias que mais ditavam o comportamento do consumidor do que ouviam suas preferências, se curvaram à máxima de Bezos, adotando sua filosofia e reestruturando sua maneira de trabalhar para transformar a ideia em prática.

Outras, que nasceram ou cresceram nos últimos anos, já o fizeram seguindo os passos que levaram a Amazon a ganhar a fidelidade de consumidores dos produtos mais diversos ao redor do mundo. Nem todas podem se dar ao luxo de perder dinheiro por anos para oferecer o melhor serviço ao cliente antes de começarem a ganhar por isso, como pôde a empresa de Bezos. Mas a mentalidade consumer centric (centrado no consumidor) hoje é parte indiscutível de qualquer negócio que almeje ser grande.

5. A ambição por gerar impacto em escala.

No contexto dos questionamentos de um comitê antitruste, Bezos defende o valor da escala do negócio. Empresas como a Amazon são as únicas capazes de construir o que a humanidade precisa, afirma ele. E cita “empreendedores de garagem” para dizer que, por melhor que sejam, não poderão dar a vida produtos como um Boeing 787, que, por sua vez, transformam o mundo. O empresário lista feitos da Amazon, incluindo doações para a sociedade. Naturalmente, sonham junto com ele o sonho da empresa aqueles que despertaram dentro de si o desejo e o ímpeto de fazer coisas grandes, que possam criar impacto no maior número possível de pessoas.

6. Decidir antes de saber.

A criação do marketplace é um dos dilemas de negócios relatado por Bezos. Criar concorrência dentro do próprio site soa como uma decisão contra-intuitiva, não à toa teve tantos desencorajadores internos. Era difícil prever, no entanto, que este seria o responsável por boa parte do crescimento e sucesso da companhia. Assim como pelo escrutínio global que agora enfrenta.

Por fim, Bezos diz que acredita que todas as grandes instituições devem ser questionadas, e a sua não é diferente. Afirma que é seu dever passar por isso de forma verdadeira e detalhista. 

À parte as questões econômicas, que envolvem o poder que Amazon (e as demais big techs) adquiriram, é impossível não constatar o valor que a cultura corporativa tem para o sucesso de uma corporação. Não dá para crescer sem que haja um propósito coletivo e um guia que mostre como agir e decidir. E isso, Jeff Bezos soube fazer.

Por Victoria Pirolla e Ariane Abdallah

leia também